As abordagens atuais de equidade de gênero buscam corrigir:
- o número de mulheres em ciência e tecnologia,
- as instituições e
- o conhecimento (Gendered Innovations!).
Gendered Innovations ou Inovações de gênero é um termo que resume a análise de sexo e gênero em todas as fases da pesquisa básica e aplicada, para estimular novos conhecimentos e tecnologias.
As inovações de gênero melhoram a equidade, a criatividade e a inovação.
Sexo e gênero são uma dimensão valiosa para a pesquisa até então pouco ou mal utilizada estrategicamente. A ciência ainda tem uma ótica de que o padrão é o gênero masculino sobre quem e o que está sendo estudado.
Exemplos de inovações de gênero
Exemplos de inovações de gênero podem ser encontradas em diversas áreas, desde Engenharia a Saúde, Meio ambiente e Computação.
Inovação de Gênero em Meio Ambiente e Medicina
Um estudo sobre projetos de água, em 13 países, mostrou que representação e participação equitativa de mulheres em comunidades de gestão de serviços de água contribuiu para o maior sucesso dos serviços (Postma et al., 2003).
Na área de saúde, homens foram beneficiados por gendered innovations na área de osteoporose, antes dominada por estudos só para mulheres. Agora o diagnóstico e as tecnologias de tratamento estão também focadas em homens (Cummings et al., 2006).
Mulheres se beneficiaram no tratamento de infarto do miocárdio, muitas vezes não diagnosticado e tratado corretamente, pois as pesquisas padrão só traziam procedimentos para homens (AHA, 2011).
Inovação de Gênero na Computação
Quando estudamos técnicas de aprendizado de programação, a maioria dos estudos não se preocupa se falamos do aprendizado de meninos ou meninas. Considera-se, automaticamente, que o sujeito de estudo, o aprendiz, é um menino. Esse tipo de viés permeia todas as áreas científicas.
Esse exemplo é um típico cenário onde inovação de gênero ajudaria a desenvolver teorias, técnicas, ferramentas e práticas inovadoras no contexto do aprendizado em computação.
Outros exemplos:
- estudos em aprendizado de máquina e tradução de textos para evitar tradução padrão para o gênero masculino (Stanford, 2016).
- GenderMag (Burnett et al., 2016): um método criado para inspecionar a usabilidade de software e levantar limitações de inclusão de gênero.
Inovação de Gênero na Computação
A colaboração na área vem ocorrendo entre grupos de pesquisa dos Estados Unidos e da União Européia, via European Commission, National Science Foundation e a Stanford University.
Estou lançando essa área de pesquisa no Brasil do ponto de vista de Ciência da Computação.
Uma das linhas atuais de minha pesquisa busca contribuir para a correção do conhecimento na Web.
Estou no início da investigação de padrões de linguagem na Língua Portuguesa que possam ser considerados enviesados em gênero, para que possamos desenvolver tecnologias capazes de detectá-los. Será possível, por exemplo, revisar websites brasileiros, identificar textos sexistas e sugerir melhorias.
Há também possibilidade de pesquisa em algoritmos computacionais, esses tão usados na Web e Big Data, pois eles podem perpetuar problemas de discriminação entre gêneros.
Durante a 8a Web Br, aprofundei mais o tema no keynote Web of Gendered Innovations. Os termos algorithmic discrimination e algorithmic fairness são usados para descrever o fenômeno da discriminação, no contexto de TI e Web.
Avaliando o impacto das inovações de gênero
O equilíbrio entre o feminino e o masculino é necessário para a sustentabilidade. Eles complementam-se na criação de tecnologias de alto impacto.
A ausência de inovações de gênero já gerou prejuízos altos. Nos Estados Unidos, entre 1997 e 2000, 10 medicamentos foram retirados do mercado por causarem riscos à vida, 4 deles perigosos para mulheres. A pesquisa pré-clínica não considerou gênero como parte dos testes.
Do ponto de vista de disrupção, o entendimento de como projetar soluções, considerando gênero, pode criar cenários nunca antes vistos.
Como mulheres projetariam carros para mulheres, por exemplo? Ou serviços em hotéis voltados para o público de negócios,?
O trabalho do 4B, um coletivo de pessoas inovadoras e empreendedoras, é exatamente sobre como projetar soluções que satisfaçam 4 bilhões de mulheres no mundo.
Por fim, há impactos intangíveis economicamente, como a falta de testes de colisão de carros apropriados para mulheres grávidas, que pode gerar danos a bebês em geração.
A equidade de gênero pode gerar impactos muito além da economia. Envolve vidas, bem-estar e a forma como enxergamos o mundo.
Referências
Postma, Leoine, Christine van Wijk, and Corine O e. 2003. Participatory quantification in the water and sanitation sector. Participatory Learning and Action (PLA) Notes 47: 13-18.
Cummings, Steven R., Peggy M. Cawthon, Kristine E. Ensrud, Jane A. Cauley, Howard A. Fink, and Eric S. Orwoll. 2006. Bone Mineral Density (BMD) and risk of hip and nonvertebral fractures in older men: A prospective study and comparison with older women. Journal of Bone and Mineral Research 21: 1550-56.
American Heart Association (AHA). 2011. Women, heart disease and stroke. Dallas, TX: American Heart Association.
Stanford (2016). Case study “Machine Translation: Analyzing Gender”. Available at: http://genderedinnovations.stanford.edu/case-studies/nlp.html
Burnett et al. (2016) Margaret Burnett, Anicia Peters, Charles Hill, and Noha Elarief. Finding Gender-Inclusiveness Software Issues with GenderMag: A Field Investigation. ACM Conference on Human Factors in Computing Systems (CHI), May 2016 (to appear). Best Paper Honorable Mention.